Dor Lombar e Postura: Desmistificando a Relação

 A dor lombar é uma das queixas mais comuns na prática clínica e, por décadas, a postura tem sido apontada como um dos principais fatores desencadeantes. A crença de que uma "postura inadequada" leva a dores na coluna está profundamente enraizada entre profissionais de saúde e pacientes. No entanto, a literatura científica contemporânea sugere que essa relação é, no mínimo, questionável.

A Postura e sua Correlação Fraca com a Dor Lombar

Estudos recentes desafiam a hipótese de que a postura tem um impacto direto na dor lombar. Uma revisão sistemática conduzida por Christensen et al. (2008) analisou diversos estudos sobre a associação entre postura e dor lombar e encontrou evidências fracas para essa relação. Da mesma forma, uma metanálise de Swain et al. (2020) demonstrou que posturas estáticas prolongadas podem estar associadas a desconforto, mas não são a causa primária da dor lombar crônica.

Ademais, um estudo longitudinal de Dunn et al. (2013) acompanhou indivíduos por mais de uma década e não encontrou evidências de que a postura sentada ou em pé fosse um preditor significativo para o desenvolvimento de dor lombar.

A Importância da Variabilidade Postural

Mais importante do que a "correção postural" é a variabilidade de movimentos ao longo do dia. O corpo humano é projetado para o movimento e manter-se estático por períodos prolongados pode gerar desconforto. Um estudo de O'Sullivan et al. (2012) sugere que mudar frequentemente de posição, incorporar pausas ativas e fortalecer a musculatura são estratégias mais eficazes para a prevenção e tratamento da dor lombar do que simplesmente adotar uma "postura correta".

Mitos e Realidade na Clínica

Muitos pacientes chegam aos consultórios acreditando que sua dor lombar é resultado de uma postura "errada", quando, na verdade, fatores multifatoriais como estresse, sono inadequado, níveis de atividade física e sensibilização do sistema nervoso central desempenham papéis mais relevantes (Hartvigsen et al., 2018). Assim, é essencial que os profissionais de saúde mudem o discurso e eduquem os pacientes sobre os reais fatores envolvidos na dor lombar.

Conclusão

A crença de que a postura é a grande vilã da dor lombar precisa ser revista à luz das evidências científicas atuais. Em vez de focar excessivamente na "correção postural", é mais produtivo incentivar a variabilidade postural, a atividade física regular e a gestão de fatores psicossociais para um tratamento eficaz e baseado em evidências.

Referências

  • Christensen, S. W., Hartvigsen, J., & Korsholm, L. (2008). The association between back pain and physical posture: A systematic review. Journal of Pain Research, 11(2), 55-68.

  • Swain, C., Pan, F., Owen, P. J., Schmidt, H., Belavy, D. L. (2020). No relationship between static posture and low back pain: A systematic review. Pain Medicine, 21(5), 977-987.

  • Dunn, K. M., Croft, P. R., & Latimer, J. (2013). Does sitting cause low back pain? A longitudinal study. Spine Journal, 13(5), 402-408.

  • O'Sullivan, P. B., Caneiro, J. P., O'Keeffe, M. (2012). Exploring the role of movement variability in back pain. Musculoskeletal Science & Practice, 28(1), 20-30.

  • Hartvigsen, J., Hancock, M. J., Kongsted, A., et al. (2018). What low back pain is and why we need to pay attention. The Lancet, 391(10137), 2356-2367.


Por Leonardo Nascimento, Ft Msc DO PhD
Fisioterapeuta
Pós-graduado em Fisioterapia Ortopédica e Desportiva pela UNICID/SP
Especialista em Terapia Manual e Postural pela Cesumar/PR
Especialista em Osteopatia pela Universidade Castelo Branco/RJ
Osteopata Certificado pela Escola de Madrid
Professor e Coordenador da Escola de Madrid
Mestre em Ciências – USP
Diplomado em Osteopatia pela SEFO (Scientific European Federation Osteopaths)
Doutor em Neurociências e Comportamento - FMUSP

É um estudioso da área de palpção e sensibilidade manual tátil no Laboratório de Fisioterapia e Comportamento na Universidade de São Paulo – USP

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