Dor Lombar Crônica e Declínio Cognitivo: O Que a Coluna Tem a Ver com o Cérebro?
Durante muito tempo, a dor lombar foi tratada como um problema “local”, centrado em discos, músculos e articulações. Mas estudos recentes vêm ampliando essa perspectiva. E um deles, publicado em 2024, sugere algo inquietante: a dor lombar crônica pode estar associada a um declínio cognitivo acelerado em idosos.
Pausa dramática. Sim, você leu certo.
O Estudo
A pesquisa analisou quatro bases de dados populacionais com acompanhamento longitudinal de milhares de idosos ao redor do mundo. Os autores avaliaram se pessoas com dor lombar crônica apresentavam maior risco de declínio cognitivo ao longo do tempo — e se esse efeito poderia ser mediado por variáveis como depressão, inatividade física ou distúrbios do sono.
A resposta? Sim, há associação. E não é pequena.
Resultados: Mente e Dor Estão Conectadas
Indivíduos com dor lombar persistente apresentaram pior desempenho cognitivo ao longo dos anos, especialmente em funções executivas e memória. O impacto foi estatisticamente significativo e clínico o bastante para levantar sobrancelhas em reuniões de geriatria e neurociência.
Mas o estudo foi além: usando análises de mediação, os autores identificaram que parte dessa associação é mediada por fatores modificáveis, como:
Inatividade física
Depressão e ansiedade
Qualidade do sono
Ou seja, tratar a dor de forma isolada, sem olhar para o quadro completo, é enxugar gelo com secador.
Implicações para a Prática Clínica
Esse estudo reforça o que a abordagem biopsicossocial já vem dizendo há tempos (mas que muitos ainda ignoram): a dor crônica é uma condição sistêmica, e o envelhecimento cognitivo pode ser acelerado por ela.
Não estamos apenas “ajustando coluna” — estamos lidando com o sistema nervoso central, suas conexões emocionais, comportamentais e fisiológicas.
Críticas Metodológicas Necessárias
Claro, nem tudo são flores epistemológicas. O estudo usa dados observacionais, o que impede inferência causal direta. Além disso, a definição de dor lombar crônica foi baseada em autorrelato, o que pode introduzir viés de memória e subjetividade. Ainda assim, a robustez dos dados e das análises estatísticas empresta credibilidade aos achados.
Conclusão
Tratar dor lombar crônica em idosos não é só uma questão de postura ou mobilidade — é uma questão de saúde cognitiva. E isso muda tudo: do plano terapêutico à forma como enxergamos o envelhecimento saudável.
A pergunta que fica é: você ainda acha que tratar só a “coluna” é suficiente?
Referência:
Makovac E, Smith SM, Wilcox SL, et al. The Longitudinal Association Between Chronic Back Pain and Cognitive Decline in Older Adults With Mediation Analysis: An Analysis of Four Population-Based Databases. J Pain. 2024. PubMed ID: 38508568
Prof Leonardo Nascimento, Ft Msc DO PhD
Fisioterapeuta
Pós-graduado em Fisioterapia Ortopédica e Desportiva pela UNICID/SP
Especialista em Terapia Manual e Postural pela Cesumar/PR
Especialista em Osteopatia pela Universidade Castelo Branco/RJ
Osteopata Certificado pela Escola de Madrid
Professor da Escola de Madrid Internacional
Mestre em Ciências – USP
Diplomado em Osteopatia pela SEFO (Scientific European Federation Osteopaths)
Doutor em Neurociências e Comportamento - FMUSP
É um estudioso da área de palpação e sensibilidade manual tátil no Laboratório de Fisioterapia e Comportamento na Universidade de São Paulo – USP
Colaborador do DO-Touch - AOA (American Osteopathic Association)
Coordenador de Grupos de Pesquisas da Escola de Madrid Internacional
Host do Podcast Osteopatia Científica
Revisor de Periódicos de Fisioterapia e Osteopatia
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