20 Anos de Evolução no Manejo da Dor Lombar Aguda no Reino Unido: Quem Mudou, Quem Ficou e Por Quê?
A dor lombar aguda continua a ser uma das maiores causas de incapacidade no mundo. Profissionais como fisioterapeutas, osteopatas e quiropráticos frequentemente atuam na linha de frente desse atendimento. Mas será que, nos últimos 20 anos (2003 a 2023), a forma como esses profissionais abordam essa dor realmente mudou? O estudo em questão resolveu responder essa pergunta — e os resultados trazem tanto esperanças quanto alertas.
O Estudo em Foco
Os autores conduziram duas pesquisas nacionais no Reino Unido (uma em 2003, outra em 2023) com amostras representativas de fisioterapeutas, osteopatas e quiropráticos, usando o mesmo caso‑vignette fictício de dor lombar aguda inespecífica para avaliar quais investigações e intervenções os profissionais relataram que utilizavam.
Principais Mudanças Observadas
O número de profissionais que optavam por nenhuma investigação aumentou ao longo dos 20 anos, indicando uma aproximação maior às diretrizes que recomendam evitar exames desnecessários.
Os fisioterapeutas passaram a adotar recomendações mais restritivas relativas ao repouso, trabalho e atividade física — o que, paradoxalmente, vai contra a ênfase atual de manter atividade.
Quiropráticos e osteopatas apresentaram mudanças distintas: quiropráticos reduziram o uso de manipulação espinhal habitual e aumentaram mobilização e acupuntura; osteopatas passaram para aconselhamentos de atividade menos restritivos, diminuíram a manipulação e aumentaram o uso de acupuntura.
Apesar dessas evoluções, persistem diferenças significativas entre as profissões em 2023, e também uma lacuna entre prática real e diretrizes recomendadas.
Análise Crítica
A força deste estudo está no desenho: duas “fotos” separadas por 20 anos com o mesmo instrumento permitem observar mudanças de comportamento profissional em larga escala.
Porém, há limitações importantes: base de dados autorrelatada (“o que o profissional disse que faria”), o uso de um caso‑modelo fictício (vignette) e não um paciente real, o que pode gerar diferença entre intenção e prática real.
Outra observação: algumas mudanças parecem contraditórias às diretrizes mais recentes — por exemplo, aumento de recomendações de repouso entre fisioterapeutas, quando hoje a ênfase é em movimento e reativação. Isso exige reflexão crítica.
Também cabe questionar: será que essas mudanças representam melhoria prática ou apenas mudança de discurso? A realidade clínica, com pacientes complexos, pode diferir muito daquela apresentada em pesquisa de self‑report.
Implicações para a Prática Clínica
Para o praticante de osteopatia ou fisioterapia, esse estudo sugere alguns pontos de atenção:
Avalie se sua prática está alinhada às diretrizes baseadas em evidências, não apenas tradições profissionais.
Cuide para que mudanças de discurso se traduzam em mudanças clínicas reais — isto é, menos exames inúteis, mais educação, mais suporte à atividade.
Observe as diferenças interprofissionais: compreender as abordagens dos outros profissionais pode melhorar o encaminhamento, a colaboração e o cuidado integrado.
Tenha consciência de que diretrizes evoluem, e o que era aceitação comum em 2003 pode já estar obsoleto em 2025.
Conclusão
O manejo da dor lombar aguda passou por transformações no Reino Unido, mas ainda estamos longe de uma prática unificada e rigorosamente alinhada às evidências. O estudo mostra avanço, mas também revela que tradição, profissão e cultura profissional continuam a moldar a prática mais do que idealmente gostaríamos. Cabe a nós, como profissionais responsáveis, interpretar, adotar e adaptar — e não simplesmente repetir.
Referência
Evans DW, Foster NE, Breen AC, Pincus T, Underwood M, Vogel S. The changing face of acute low back pain management by physiotherapists, osteopaths and chiropractors in the UK: a 20‑year comparison from 2003 to 2023. BMC Musculoskeletal Disorders. 2025;26:887. doi:10.1186/s12891‑025‑09192‑9
Prof Leonardo Nascimento, Ft Msc DO PhD
Fisioterapeuta
Osteopata
Pós‑graduado em Fisioterapia Ortopédica e Desportiva pela UNICID/SP
Especialista em Terapia Manual e Postural pela Cesumar/PR
Especialista em Osteopatia pela Universidade Castelo Branco/RJ
Osteopata Certificado pela Escola de Madrid
Professor da Escola de Madrid Internacional
Mestre em Ciências da Reabilitação – USP
Diplomado em Osteopatia pela SEFO (Scientific European Federation Osteopaths)
Doutor em Neurociências e Comportamento - FMUSP
Estudioso da área de palpação e sensibilidade manual tátil no Laboratório de Fisioterapia e Comportamento na Universidade de São Paulo – USP
Colaborador do DO‑Touch (American Osteopathic Association)
Coordenador de Grupos de Pesquisa da Escola de Madrid Internacional
Host do Podcast Osteopatia Científica
Revisor de Periódicos de Fisioterapia e Osteopatia
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