Manipulações Cervicais: Benefícios, Riscos e o Papel da Prática Baseada em Evidências

 As manipulações cervicais são amplamente utilizadas por fisioterapeutas, quiropraxistas e osteopatas no tratamento de condições musculoesqueléticas da coluna cervical, como cefaleias cervicogênicas, dor cervical inespecífica e restrições de mobilidade. Mas afinal, qual é o saldo entre benefício e risco? O que diz a literatura científica? E como devemos posicionar essa técnica na prática clínica?

Benefícios Evidenciados

Estudos clínicos e revisões sistemáticas apontam para benefícios relevantes:

  • Redução da dor e melhora da função em casos de dor cervical aguda e subaguda.

  • Melhora na amplitude de movimento da coluna cervical.

  • Efeito positivo sobre cefaleias cervicogênicas, especialmente quando associadas a restrição articular.

  • Impactos neurofisiológicos positivos imediatos, como modulação da dor, alteração de limiares de dor à pressão e relaxamento muscular.

Exemplos de evidências:

  • Gross et al. (2015) demonstraram, em uma revisão Cochrane, que manipulações cervicais são eficazes para dor cervical aguda e subaguda, quando combinadas com exercícios.

  • Bialosky et al. (2009) propuseram mecanismos neurofisiológicos para explicar os efeitos imediatos das manipulações, incluindo modulação descendente da dor.

E os Riscos?

É impossível falar de manipulação cervical sem mencionar os eventos adversos. Embora raros, os riscos mais debatidos incluem:

  • Dissecção de artéria vertebral, potencialmente associada a Acidente Vascular Cerebral (AVC), embora a relação causal direta ainda seja controversa.

  • Reações adversas menores, como dor local, rigidez, fadiga e cefaleia transitória (ocorrem em até 50% dos pacientes e são autolimitadas).

O estudo de Puentedura et al. (2012) alerta que, embora as dissecções possam ocorrer espontaneamente, a manipulação pode ser um fator precipitador em pessoas predispostas.

Estratégias para uma Prática Segura

  1. Avaliação minuciosa de bandeiras vermelhas: histórico de trauma cervical recente, distúrbios vasculares, instabilidade ligamentar.

  2. Teste de tolerância à mobilização, e não “teste de artéria vertebral”, que carece de validade.

  3. Consentimento informado real, explicando claramente os riscos, mesmo que raros.

  4. Combinar manipulação com exercício e educação, como propõem as diretrizes clínicas atuais.

Conclusão: Uma Ferramenta, Não um Dogma

As manipulações cervicais podem ser úteis — especialmente em casos bem indicados, dentro de um plano multimodal. No entanto, não são obrigatórias para tratar dor cervical, e seu uso deve ser guiado por avaliação clínica criteriosa, comunicação clara com o paciente e atualização constante do profissional.

Na osteopatia contemporânea, o toque continua importante. Mas é o raciocínio clínico, apoiado na melhor evidência disponível, que deve guiar nossas mãos.


Referências:

  • Gross A, et al. Manipulation and mobilisation for neck pain contrasted against an inactive control or another active treatment. Cochrane Database Syst Rev. 2015.

  • Bialosky JE, et al. Spinal manipulative therapy-specific changes in pain sensitivity in individuals with low back pain. J Pain. 2009.

  • Puentedura EJ, et al. Risk factors and clinical presentation of cervical arterial dissection: preliminary results of a case-control study. J Orthop Sports Phys Ther. 2012.


Prof Leonardo Nascimento, Ft Msc DO PhD
Fisioterapeuta
Pós-graduado em Fisioterapia Ortopédica e Desportiva pela UNICID/SP
Especialista em Terapia Manual e Postural pela Cesumar/PR
Especialista em Osteopatia pela Universidade Castelo Branco/RJ
Osteopata Certificado pela Escola de Madrid
Professor da Escola de Madrid Internacional
Mestre em Ciências – USP
Diplomado em Osteopatia pela SEFO (Scientific European Federation Osteopaths)
Doutor em Neurociências e Comportamento - FMUSP
É um estudioso da área de palpação e sensibilidade manual tátil no Laboratório de Fisioterapia e Comportamento na Universidade de São Paulo – USP
Colaborador do DO-Touch - AOA (American Osteopathic Association)
Coordenador de Grupos de Pesquisas da Escola de Madrid Internacional
Host do Podcast Osteopatia Científica
Revisor de Periódicos de Fisioterapia e Osteopatia

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