Efeitos da Osteopatia no Refluxo Gastroesofágico: O Que Diz a Evidência Científica?
O refluxo gastroesofágico (DRGE) é uma condição comum que afeta uma parcela significativa da população, caracterizada pelo retorno do ácido gástrico para o esôfago, causando sintomas como azia, regurgitação e desconforto torácico. Além dos tratamentos farmacológicos, abordagens complementares têm sido exploradas, entre elas a osteopatia. Mas qual é o impacto real dessa abordagem no manejo do refluxo? Este texto analisa as evidências mais recentes sobre o papel da osteopatia no tratamento da DRGE.
1. Contextualização do Refluxo Gastroesofágico (DRGE)
A DRGE é multifatorial, podendo ser causada por disfunção do esfíncter esofágico inferior, aumento da pressão intra-abdominal, hábitos alimentares inadequados e estresse. Além dos sintomas clássicos, pode impactar o sono, a qualidade de vida e estar associada a complicações como esofagite ou estenoses esofágicas. O tratamento clássico envolve o uso de inibidores de bomba de prôtons (IBPs), mas muitos pacientes relatam persistência de sintomas ou efeitos colaterais com uso prolongado.
2. A Osteopatia Como Intervenção no Refluxo
A osteopatia propõe uma abordagem integral, considerando as relações entre estruturas viscerais, musculoesqueléticas e autonômicas. No caso da DRGE, técnicas osteopáticas podem ser aplicadas com os seguintes objetivos:
Melhorar a mobilidade do esôfago e do estômago com liberações viscerais.
Reduzir tensão do diafragma, facilitando sua função como esfíncter acessório.
Atuar sobre o nervo vago, que modula a motilidade gástrica e esofágica.
Tratar disfunções torácicas e cervicais que influenciam a mecânica da respiração e a pressão intra-abdominal.
💡 Exemplo de técnicas utilizadas: mobilização do diafragma, liberação do ligamento gastrofrénico, manipulação torácica e cervical.
3. Revisão Sistemática: Metodologia e Resultados
A revisão sistemática de Chimenti et al. (2022) analisou a eficácia da terapia osteopática (OMT) em distúrbios gastrointestinais, incluindo estudos que investigaram especificamente a DRGE. Os principais pontos metodológicos incluem:
Critérios de inclusão: Ensaios clínicos randomizados com pacientes diagnosticados com condições digestivas, incluindo DRGE.
Instrumentos de avaliação: Escalas de sintomas, qualidade de vida, frequência de episódios e uso de medicamentos.
Resultados: Pacientes tratados com OMT apresentaram redução significativa nos sintomas de refluxo comparados a grupos-controle.
Porém, os autores alertam sobre a alta heterogeneidade metodológica entre os estudos, incluindo variedade de técnicas utilizadas, duração dos protocolos e diferentes formas de aferição dos desfechos.
4. Discussão dos Achados
Os resultados apontam para um potencial efeito positivo da osteopatia visceral no alívio dos sintomas de DRGE. Acredita-se que a combinação de efeitos biomecânicos (mobilidade do estômago e do diafragma) e autonômicos (modulação vagal) possa justificar os efeitos observados.
Comparada à farmacoterapia, a osteopatia não se propõe como substituto, mas como complemento. Em pacientes com refratariedade aos IBPs ou que preferem abordagens menos invasivas, pode ser uma opção clínica viável.
Entretanto, é importante destacar:
A necessidade de ensaios mais robustos, com cegamento e padronização de protocolos.
A ausência de marcadores objetivos em muitos estudos (ex: pHmetria esofágica).
A importância da seleção adequada dos pacientes que podem se beneficiar da OMT.
Conclusão
A osteopatia tem mostrado resultados promissores como abordagem complementar no manejo da DRGE, especialmente através de técnicas viscerais e autonômicas. Embora as revisões sistemáticas indiquem redução nos sintomas, a qualidade metodológica dos estudos ainda limita a generalização dos resultados. O uso da OMT deve ser individualizado, integrado com outras abordagens e sustentado por reavaliações clínicas constantes.
Referências
Chimenti, R. L., et al. (2022). Effectiveness of osteopathic manipulative treatment for gastrointestinal disorders: a systematic review and meta-analysis. Complementary Therapies in Medicine, 70, 102861.
Guillaud, A., et al. (2018). Visceral osteopathy: A systematic review of effect and mechanisms. Journal of Bodywork and Movement Therapies, 22(3), 544–552.
Licciardone, J. C. (2005). Osteopathic manipulative treatment in somatic dysfunction: current status and future directions. Journal of the American Osteopathic Association, 105(3), 123–125.
Prof Leonardo Nascimento, Ft Msc DO PhD
Fisioterapeuta
Pós-graduado em Fisioterapia Ortopédica e Desportiva pela UNICID/SP
Especialista em Terapia Manual e Postural pela Cesumar/PR
Especialista em Osteopatia pela Universidade Castelo Branco/RJ
Osteopata Certificado pela Escola de Madrid
Professor da Escola de Madrid Internacional
Mestre em Ciências – USP
Diplomado em Osteopatia pela SEFO (Scientific European Federation Osteopaths)
Doutor em Neurociências e Comportamento - FMUSP
É um estudioso da área de palpação e sensibilidade manual tátil no Laboratório de Fisioterapia e Comportamento na Universidade de São Paulo – USP
Colaborador do DO-Touch - AOA (American Osteopathic Association)
Coordenador de Grupos de Pesquisas da Escola de Madrid Internacional
Host do Podcast Osteopatia Científica
Pesquisador do CABSIN (Consórcio Acadêmico Brasileiro de Saúde Integrativa)
Revisor de Periódicos de Fisioterapia e Osteopatia
Comentários
Postar um comentário